Um fator muito importante para a convivência em sociedade e a relação
dela com si própria e com a subjetividade de seus colaboradores, assim como o
Estado e as instituições que a coordenam, é a justiça. Definir justiça é um
parecer um tanto ambíguo, pois tem contrastes na humanidade, variante conforme
a cultura que a compõe. Mas o que interessa nesse artigo é dizer algo sobre
justiça na democracia e República, como é o nosso caso e do filósofo e jurista
norte-americano John Rawls, que publicou uma extensa obra sobre “Teoria da
Justiça”, onde tenta justificá-la onde ela não existe, assim como definir seus
pormenores, como seu papel, definição, onde é exigida sua interação e muitos
mais.
Peguei o trecho inicial de sua
obra, onde ele inicia o título mostrando qual é o verdadeiro papel da justiça,
qual é a sua intenção em função teorética.
Segundo Rawls, “cada pessoa
possui uma inviolabilidade fundada na justiça que nem o bem-estar de toda a
sociedade pode desconsiderar. Por isso, a justiça nega que a perda da liberdade
de alguns se justifique por um bem maior desfrutado por outros. Não permite que
os sacrifícios impostos a poucos sejam contrabalançados pelo número maior de
vantagens de que desfrutam muitos.” (p.4)
Apesar de o jurista ser
considerado contratualista, onde o bem maior seria o maior privilégio para a
sociedade, no trecho acima ele não revoga os bens individuais em prol do bem
maior. A justiça não permite de modo nenhum que um indivíduo possa ser
prejudicado mesmo em bem de uma sociedade completa. Como uma sociedade tem em
seu direito democrático o direito à justiça, o cidadão singular definitivamente
também tem o seu. Sobrepondo-se um sobre o outro, comete-se injustiça e essa
não pode prevalecer jamais sobre a justiça.
Não nos esqueçamos da teoria da
justiça. Essa, no seu fundamento, é considerada um bem e o mal sobre ela, não
pode prevalecer, como a injustiça. Como derrubar uma casa de uma família para o
crescimento de uma cidade? É injusto e para a política, uma das instituições
praticantes da verdade e da justiça, não pode cometer um mal. A solução, justa
e correta, seria derrubar essa casa e reconstruí-la nos domínios do município,
mostrando que o termo referido não é somente um ente metafísico, e que pode,
sim, ser pragmático.
Mas nem sempre a justiça é um
bem para ser colocado in praxis. Na maioria
dos casos, ela não deixa de sair de seu lugar onde sempre esteve à vontade: na
Constituição e nos livros. Não só nesse país, mas também nos EUA, terra de Rawls,
onde ele pode refletir sobre seu papel, teoria e prática. A sociedade vê-se
adentro do mal maior sempre e habituou-se a ela. A injustiça guia a contemporaneidade
cega e indistinta. Ela não define mais o que é certo e o que é errado, deixando-se
andar pelos caminhos arruinados da humanidade hipócrita. Não se vê com forças
de superação para um caminho fidedigno da justiça.
Rawls não se portou somente com
a teoria da justiça. Fez o que se poderia dizer de “instruções para uma prática
maior possível” dela. Já que a teoria não lidava com a realidade social
democrática, tentou resolver o problema da sobreposição da injustiça sobre a
justiça na própria teoria. Parece meio confuso, mas ele resolve sim a questão: “A
única coisa que nos permite aquiescer a uma teoria errônea é a falta de uma
melhor; de maneira análoga, a injustiça só é tolerável quando é necessária para
evitar uma injustiça ainda maior. Por serem as virtudes primeiras das
atividades humanas, a verdade e a justiça não aceitam compromissos.” (p.4)
Não será que as leis
democráticas não se fundamentam não na justiça, mas sobre injustiças menores
sobre as maiores? Principalmente no Brasil onde leis se reformulam praticamente
todos os dias. Parece que John Rawls pensou sobre o esquema jurídico brasileiro
para refletir sobre tal questão. Nem se fosse brasileiro nato... Não temos
exemplo mais evidente do que essa falha no nosso sistema de leis. Erros são
percebidos, evidenciados e trocados por erros menores. Não se chegam à solução.
Nossa constituição e sistema jurídico são defasados e reformulados
continuamente, pois a verdade não tem definição clara o suficiente. Isso quer
dizer que não se traçam objetivos claros e plenos o bastante para definir
justiça e verdade no nosso país. Quanto mais isso ser trabalhado, mais nosso
país poderá se desenvolver humanamente. Estamos “engatinhando” no sistema
penal, mas ainda estamos muitos longe de saber definir e saber chegar nessa
definição. Não existe caminho onde não existe destino.
Referência bibliográfica:
RAWLS, John. Uma
teoria da justiça. 3ª edição. São Paulo: Martins Fontes, 2008